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Análise normativa da comercialização de recursos minerais após o vencimento da guia de utilização



A guia de utilização é a autorização concedida pelo Estado ao particular para a exploração de recursos minerais, de forma excepcional, antes da outorga da concessão de lavra, mediante o atendimento dos requisitos e limites fixados em lei.


O Código de Mineração, Decreto-Lei n. 227/1967, prevê em seu art. 22, § 2º, que: É admitida, em caráter excepcional, a extração de substâncias minerais em área titulada, antes da outorga da concessão de lavra, mediante prévia autorização da ANM, observada a legislação ambiental pertinente. A norma foi replicada no Regulamento do Código, Decreto 9.406/2018, em seu art. 24.


No mesmo sentido, a Consolidação Normativa do DNPM - Portaria 155/2016, em seu art. 67, conceitua a guia de utilização como sendo o “documento emitido pelo DNPM, fundamentado em critérios técnicos, que autoriza, em caráter excepcional, a extração de substâncias minerais em área titulada, antes da outorga da portaria de lavra”.


O requerimento da citada autorização seguirá as regras estabelecidas na Portaria 155/2016 e deverá ser instruído com declaração com justificativa técnica e econômica, com a indicação da quantidade de cada substância mineral a ser extraída e com o prazo de validade pleiteado, dentre outros elementos previstos no art. 104 e seguintes.


A emissão da guia de utilização permitirá a lavra em caráter excepcional, mas fixará limites no que tange: i) à substância mineral, ii) ao local, dentro da poligonal, passível de exploração, iii) ao prazo de vigência e, iv) ao volume de recursos minerais máximo a ser produzido.


Para o atendimento da discussão ora proposta, cumpre destacar duas regras relativas ao prazo e ao volume: a) a legislação limitou o prazo de vigência da autorização em até 3 (três) anos, admitida uma única prorrogação, por igual período, nos termos do art. 24, parágrafo único, do Decreto 9.406/18, b) o volume máximo permitido para exploração está indicado no art. 103, anexo IV, da Portaria 155/2016 e é limitado por ano de vigência da guia de utilização.


Considerando que as normas regentes tratam da guia de utilização como instrumento para a exploração/extração de recursos minerais antes da outorga do título definitivo, com volume e prazo definidos, seria possível sua comercialização após findada sua vigência?


A resposta é positiva.


Analisando-se a legislação, infere-se pela inexistência de impedimento legal para tanto.


O minerador, que indica no Relatório Anual de Lavra - RAL, o volume produzido durante o período de vigência da guia de utilização, mas que permaneceu em estoque, poderá comercializá-lo em momento posterior.


E outro não poderia ser o entendimento, visto que tratando-se de extração mineral regularmente realizada, o produto da lavra deixa de ser bem da União para se tornar propriedade do minerador (art. 20, IX c/c art. 176, CF). Caberá a ele decidir o momento mais adequado para ofertar os produtos no mercado.


Note-se que as normas acima transcritas (art. 22, § 2º, Decreto-Lei n. 227/1967 e art. 67, Portaria 155/2016) são claras ao dispor que a autorização excepcional concedida pela União é para fins de extração/exploração dos recursos minerais e não para a comercialização dos bens.


O Parecer 005/2013/PF/DNPM/MG-GAM analisou a matéria aqui tratada, também concluindo pela “(...) possibilidade de alienação do produto da lavra, após o término da vigência de Guia de Utilização, desde que a extração da substância mineral tenha sido realizada em conformidade com o título autorizativo.


Isto porque, sendo elucidado no Parecer:


(...) não há vedação à comercialização do produto da lavra sem o amparo da Guia de Utilização. O que as normas legais impõem é a necessidade de a extração das substâncias minerais ocorrerem nos termos do título autorizativo. Até mesmo porque, atribuída ao concessionário a propriedade do produto da lavra, assiste-lhe a faculdade dele dispor, porquanto operou-se a transferência de domínio do que antes era recurso mineral e foi transformado em produto da lavra.


No mesmo sentido decidiu o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1652223 RS 2017/0023987-9, de relatoria da Ministra Assusete Magalhães, parcialmente abaixo transcrito:


RECURSO ESPECIAL Nº 1.652.223 - RS (2017/0023987-9) RELATORA : MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES RECORRENTE : UNIÃO RECORRIDO : COMPACTA COMÉRCIO DE PEDRAS LTDA ME ADVOGADOS : ELIAS PRESTES MOREIRA KARAM - PR033061 MARCELO GANDOLFI SIQUEIRA - PR028814 VIRGÍNIA GANDOLFI SIQUEIRA NETA - PR075450 DECISÃO Trata-se de Recurso Especial, interposto pela UNIÃO, com fulcro na alínea a do permissivo constitucional, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado: "DIREITO ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ALIENAÇÃO DE MINÉRIO MANTIDO EM ESTOQUE APÓS EXPIRAR A GUIA DE UTILIZAÇÃO. LEGALIDADE. O FATO GERADOR DA CEFEM RECOLHIDA É A VENDA DO MINÉRIO E NÃO A SUA LAVRA. 1. A apelada recolheu a CEFEM por venda de basalto em período subsequente ao término de validade da Guia de Autorização. Desse lançamento no sítio da Diretoria de Procedimentos de Arrecadação - DIPAR, houve a presunção de que a apelada tivesse lavrado minério sem autorização do órgão competente. Tal prova cumpria à União realizar, porque constitutiva do seu direito. Não basta a mera presunção. 2. O detentor de Guia de Utilização está autorizado a extrair e comercializar o minério, desde que efetue o recolhimento da CEFEM. 3. Não há óbice legal para a comercialização de minério mantido em estoque após a expiração da Guia de Utilização. 4. Apelação a que se nega provimento" (fl. 870e). (...)

(STJ - REsp: 1652223 RS 2017/0023987-9, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Publicação: DJ 27/05/2019)


Os recursos minerais produzidos licitamente durante a vigência da guia de utilização poderão ser comercializados a qualquer momento, a critério do minerador, tendo em vista que a propriedade do produto da lavra lhe foi garantida por aplicação do art. 176 da Constituição Federal e análise sistemática das normas que versam sobre a matéria.


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